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segunda-feira, 26 de março de 2018

Um case dentro do ônibus


Joaçaba é uma cidade acolhedora, situada no Oeste de Santa Catarina. Para chegar lá, precisa-se de oito horas, entre entradas e saídas, que o ônibus vai fazendo, em cada cidadezinha que tenha uma rodoviária. Chamamos de transporte semi-direto. Imaginem se fosse indireto!
 E, nesse jeito, os passageiros vão entrando e saindo, cada um com o seu destino e seu objetivo de viagem.


O meu destino, há anos, é sempre o mesmo -  Universidade do Oeste de Santa Catarina  (UNOESC). Onde alunos, frequentadores de cursos de Pós Graduação esperam seus professores para trocas de experiências, conteúdos e conhecimentos. Vou sempre muito animada por gostar do que faço e principalmente pelas pessoas maravilhosas que lá encontro. Um jeito muito deles de receber quem chega. São grandes anfitriões.


O chimarrão e a cuia compõem o ambiente da sala de aula. Um hábito que cultivam por serem vizinhos do estado do Rio Grande do Sul e porque faz parte da tradição. Quando vi todo esse '"apetrecho"  de forma tão caprichada entendi a importância desse chá e do ritual para muitos, que não ficam sem ele.

                                                         " Onde há chimarrão existe amizade.
                                                            Existe um povo que sabe que a maior felicidade
                                                           é crer que a simplicidade te faz rico em qualquer chão"                                                                                                                               Carlos Eduardo Back



Foi um fim de semana estudando o Comportamento do Consumidor: fatores que influenciam no processo de compra; análise de cases; técnicas que apoiam a identificação dos desejos, anseios, restrições, comparações que o consumidor realiza antes de definir pela compra, entre outros.


        O ser humano é mesmo muito complexo. Parecem tão iguais, mas todos tão diferentes!
        Com tantos senões, conflitos, carências e formas diversas de sentir o mundo e confortar o próprio coração... ID - EGO - e  SUPEREGO, um trio que deu o que falar com suas subdivisões psicológicas e emocionais.

                                       " A filosofia do contente, é uma armadilha do consumo.
                                          A  existência tem amplitude, que inclue: medos, perdas, dores."
                                                                                                                    Contardo Calligaris


Verdade,  a existência do ser humano revela em si, medos, perdas, dores e necessidades. Isso ficou comprovado numa conversa que escutei dentro do ônibus, ao regressar: Um  Case para análise.

" Aquela senhora, um tanto agitada e desajeitada andava pra lá e pra cá na rodoviária. Eu fiquei observando aqueles movimentos nervosos dela. Corria ao seu lado um garotinho, que acredito ter uns 6 anos de idade. Logo descobri que era o seu neto; um olhar triste que muitas vezes olhava pra mim e tentava sorrir quando eu sorria pra ele. 

Embarcamos no ônibus e logo se ajeitaram na poltrona ao lado, perto da minha. Eles me intrigavam. Não sei se era o olhar do pequeno ou a forma como aquela avó lidava com ele; as vezes muito agressiva e imediatamente depois cheia de carinho. Mas, percebia uma certa alegria por parte dos dois de estarem iniciando aquela viagem. 

Não demorou muito ele falou: " a gente vai visitar o pai, né vó? ele mora na cadeia, né?
 O senhorzinho sentado na poltrona a frente falou para si próprio, em voz alta: morar na cadeia não deve ser bom! Senti uma mistura de compaixão pelo pequeno e graça  pelo jeitão do senhor! Parecia surreal.

O silêncio foi interrompido por uma troca de conversa entre a senhora que sentava ao meu lado e a avó. E, as duas conversaram sem parar pelo caminho afora. Soube, então em detalhes, a vida de uma e de outra. Todas as doenças, dores e até amores deixados para atrás por conta do filho ter sido preso e ficar responsável por dois menores. 

Finalmente chegou ao destino. Ficaria na casa da filha e no dia seguinte faria uma visita ao filho, no presídio, levando o neto pela mão. E, logo foi dizendo: graças a Deus que chegamos. Amanhã vou poder abraçar o meu filho. E, saiu apressada levando  o pequeno, que longe, ainda virou-se e deu mais um sorriso acanhado para mim. 



Nessa hora tudo ficou para trás: os conceitos, os cases de sucesso, os recursos para entender o comportamento do consumidor. Entendi que, cada ser humano é movido por aquilo que representa conforto para a sua alma. O melhor produto ainda é o amor. Esse,  move a essência de cada consumidor. O afeto é capaz de suprir as mais primárias necessidades e carências. Para aquela mãe, não importava o meio, importava era suprir a necessidade básica que ela tinha de estar com o seu  filho, não importando o lugar. Um verdadeiro Case de Sucesso.


Dedico esta postagem aos meus alunos e ao Wesley, o garotinho do olhar triste. 
Obrigada por me sensibilizar com a sua ingenuidade de criança.





sexta-feira, 16 de março de 2018

Óbidos, um lugar pra se perder

Aquele sábado amanheceu chuvoso em Lisboa. Era preciso muita vontade para sair pela rua afora. O vento estava mesmo bem gelado e a chuva associada a ele era tão forte que minha sombrinha  empinou-se algumas vezes para olhar para atrás. Mesmo assim...lá fui eu.

O objetivo do dia era instigador. Depois de muitos anos, finalmente iria conhecer a cidade de Óbidos, que está localizada perto de Lisboa ( 80 km). Um metrô para o primeiro trajeto, saindo da estação da Praça da Espanha, em direção à estação Campo Grande. Chegando ali era hora de pegar um ônibus ( empresa Rodotejo) que nos levaria até o destino do dia, por 15 euros ( ida e volta). Sim! Eu e uma família de japoneses,  que não sabia bem pra onde estava indo, com um mapa na mão e sorrisos continuados no rosto e mesmo sem conhecer uma palavra em português e poucas em inglês ia se comunicando.


Óbidos remonta a um período antes de Cristo e sabe-se que por lá passaram romanos, mouros e visigodos. Mais tarde, a cidade ficou conhecida como o " presente das rainhas" por fazer parte do dote de muitas, como da Rainha Santa Isabel, Filipa de Lencastre, Urraca de Castela, Leonor de Aragão e Leonor de Portugal.


A atmosfera do lugar traz uma certa nostalgia. E, o imaginário da gente voa através do tempo como muitas vezes acontece nos filmes. Tudo ali é real, mas parece que não é, entende? Uma mistura de pensamentos. Uma confusão de épocas. Uma dificuldade de se transpor.


De fato " o caminho se faz na caminhada" saudosa Cora Coralina! Caminhando por onde as pedras vão indicando. E, simplesmente deixando-se ser levado e ir se perdendo, por vontade, em cada esquina. Porque pressente-se que um horizonte abrir-se-á a qualquer momento.


                                       " Feche a porta, mude o disco, limpe a casa, sacuda a poeira.
                           Afinal se coisas boas se vão é para que coisas melhores possam vir..."
                                                                                                       Fernando Pessoa


                        O que diria o poeta, mediante esse todo, visto através de um rasgo de olhar?
                                                                                    Provavelmente diria:
                     " eu sou do tamanho daquilo que vejo, e não do tamanho da minha altura".
                                                                                    Sábio Fernando!


 Nesse contexto, o meu olhar corre por um vasto casario, com telhados repetidos com a intenção de marcar o tempo e gravar na memória esse visual que tira o meu fôlego.


Lá do alto, passeando destemida por estreita passarela, não só avisto a grandiosidade do momento, como também a beleza do privilégio. Estar ali, naquele lugar, naquele instante admirando uma remota história, por entre flores de cerejeiras e limões sicilianos, deve ser mesmo um presente da vida! E, a respiração traz um sabor de " Meu Deus, olhe bem onde estás, brasileira"! Em terras portuguesas, com certeza! Um respiro profundo e muita gratidão!


As muralhas tem cerca de 2 km de comprimento e durante o percurso deslumbrantes vistas que nos cativam o olhar. Perspectivas da região, que só se tem lá de cima. E, não posso deixar de comentar. Sabem quem encontrei nesse estreito caminho? eles...a família de japoneses, que trocamos boa comunicação... por repetidos sorrisos, inclinações e cumprimentos!

E a janela se abre. Um ponto de claridade que vem de dentro da alma e vai ao encontro do distante...abrindo-se para o mundo. Esse mundo que, muitas vezes nos intimida, porque é grande demais;  ao mesmo tempo, tão pequeno e breve, que cabe dentro de um só coração. Tudo para lembrar que  " tenho em mim todos os sonhos do mundo". Fernando Pessoa

Um brinde a esse sábado chuvoso. Uma homenagem a todos que se encantam com as sutilezas da vida e com as surpresas que ela pode trazer em si. Um brinde às sensibilidades do ser humano. Feliz de quem as tem. Um brinde a Fernando Pessoa e a todos os poetas anônimos, que carregamos dentro de nós.


                                                                                                                   

                                                                                      Deixo-me, por vontade, me perder
                                                                                      Sei que já me encontro, logo ali.
                                                                                                                             Santè